segunda-feira, 28 de abril de 2014

Seqüência 11 - uma conversa de redação



            Darío Vuturuá pensava na sorte que tinha, quando na primeira tarde à frente da redação, ele também teve de decupar alguns muitos minutos de discurso furado, convertendo os atropelos do português em uma esmiuçada transcrição que logo teria a gramática sumariamente executada pela revisão de Furquinha, o patrão mais estranho que já tivera o desprazer de ter. Mas Darío também estava ansioso pela chegada de Tompinhão-Coelho, que ele já havia percebido rabiscando algumas caricaturas de Furquinha às escondidas, normalmente com o patrão caracterizado como um apresentador de programas de domingo, de pé sobre um púlpito, microfone à mão, palma levantada como que a orar, condenado, na forma de desenho, a eternamente soltar parvoíces medíocres como “A FORÇA QUE TENHO NÃO ME FOI DADA, GANHEI COM SUOR E ORAÇÕES” ou “EU SOU UM COMUNICADOR, TÃO SABENDO?” ou ainda, e esta acabava sendo a preferida de Darío Vuturuá, com o Furquinha-caricatura com as mãozinhas pro alto e dedinhos balançando, ele tinha até lágrimas nos olhos (arrojado, o desenho convertia uma das lágrimas em balão), dizendo “EU ENSINEI MACUCO A LER!!!”, o que quase acabou com um de seus discursos porque ninguém dos que viram o desenho conseguiu segurar as risadas. E Darío estava ansioso para convidar Tompinhão-Coelho para uma empreitada diferente que agüentar o blá-blá-blá de Furquinha ou observar Pernalonga cavar por todo o quintal em busca de uma dolinha de maconha.
            Então, Tompinhão-Coelho chegou, de óculos escuros, disfarçando a óbvia chapação. E Darío Vuturuá foi lá falar com ele.

DARÍO VUTURUÁ
Dá uma olhada nisso aqui, ô, Tomás.

TOMÁS PINHÃO
Bicho, como é que você ouviu me chamarem naquela noite no Pernalonga?

DARÍO VUTURUÁ
Tompinhão?

TOMPINHÃO
Tompinhão-Coelho, meu camarada.
Não é o nome com que me batizaram, mas é o que me faz eu.
Sacou, Ururuá?

DARÍO VUTURUÁ
É Vuturuá. Mas pode me chamar só de Darío.

TOMPINHÃO-COELHO
Vou chamar você de Dario. Sem o acento.

DARIO
Melhor, não, Coelho.

COELHO
Por que não?

DARÍO
Me chama de Darío, que na escola eu ficava puto quando me chamavam errado.

T.P.C.
Então, você entendeu o meu ponto. E me chama de Tompinhão-Coelho, que eu prefiro.
Mas, diga lá, Darío, o que você queria falar comigo?
Quer que te descole mais fumo?

D.V.
Não, não. Obrigado. Eu prefiro ir devagar, sabe?
Na verdade...
...eu fico meio lento quando fumo.

T.P.C.
Tá certo, mas me conta aí, que pasta é essa que você tá segurando aí, doido pra abrir?

D.V.
Ah, essas são as notícias do monstro, cara.

            E Darío Vuturuá entregou uma pasta repleta de recortes de jornal para Tompinhão-Coelho. E um novo monstro estava para ser gerado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário