Pernalonga
foi quem começou a cantar
Tá na hora, tá na hora
Eeeu queero laricar
Fuma, fuma, tosse, tosse
O beque não vou largar
Dá um tapa e vai pra frente,
solta a fumaça e cai pra trás
Se quiser fumar com a gente,
pode vir, que aqui tem mais
Acende o beque aê, ô ô ô
Acende o beque aê, ô ô ô
Acende o beque aê, ô ô ô
parando logo com a paródia
porque cantarolar aquilo sem um baseado não tinha serventia alguma. Tanto que
os roedores, Pernalonga e Tompinhão-Coelho, apertavam o passo, ambos carregando
mochilas, bolsas e, no caso do primeiro, uma vassoura nova.
Samurai havia desaparecido no momento em que Pernalonga
entrara em cena. Não
só não gostava de ser visto na companhia de um traficante pé-de-chinelo, como
nunca vira muita graça em fumar maconha. Tompinhão-Coelho, por outro lado,
estava ansioso pela familiar neblina de torpor.
No caminho para o Morro do Palhaço, ou Bairro Doutor
Chiquito, como preferem os moradores, Pernalonga e Tompinhão-Coelho foram interrompidos
por um senhor bem matuto, que estava apoiado na bicicleta parada, debaixo do
chuvisco, pitando um cigarrinho fedorento de palha por sob a aba do chapéu .
Ele, então, tirou o chapéu, fez uma mesura seca e falou pra Pernalonga: “Ô, meu
menino. Meus sentimentos, tá? Que Deus-Nosso-Senhor te traga consôl, tá?”
Pernalonga agradeceu, disse mais algumas palavras e
continuou andando. Logo, Tompinhão-Coelho perguntou-lhe do que se tratava
aquilo: “Quem morreu, Perna?”
“Meu tio”, respondeu o outro, languidamente.
“Aquele que te criava? Quando isso, cara?”
“Ontem. O enterro foi hoje de manhã.”
Tompinhão-Coelho engoliu em seco, parou por um segundo e
então tentou se sair com isto: “Pô, bicho... Então... Você... Você nem chegou a
tempo de ver o velho descer?”
“Descer pro inferno?”
Putz, quanta merda já se foi dita depois da morte de
alguém? Com certeza nada se comparava à vez que a Molecada ia tomar cachaça na
Capela Mortuária e se depararam com um velório, desceram amuados e Samurai se
queixou para Zelito: “Porra, a gente ia sentar quieto lá, mas um raio duma
mulher morreu e agora tem que ficar todo mundo pela”, disse naquele atropelo
natural todo dele.
E
ao que Zelito respondeu que "Sim, é o velório da minha mãe" e ninguém
soube onde enfiar a cara, Samurai, sendo o mais velho, deu também os pêsames e
quase na mesma hora riu como o diabo, que afinal o mico era bom.
Mas Tompinhão-Coelho se salvou de não ter onde enfiar a
cara, que um carro parou bem do seu lado, com jeito de que era pra eles dois
que parava, ou para entrarem ou para o govorite comum, que é o que era. E por
ser incapaz de identificar a marca ou a placa do carro, ele soube que era Jorge
Tadeu quem estava dirigindo.
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